quinta-feira, 9 de julho de 2020

Livros Poéticos e Sapienciais

Os Escritos Poéticos e Sapienciais

A Bíblia Hebraica, após as suas duas primeiras seções, conhecidas respectivamente como a Lei e os Profetas, contém uma terceira, chamada de modo genérico de os Escritos (ketubim).
Esta terceira seção consiste num conjunto de treze livros: Rute, 1 e 2Crônicas, Esdras, Neemias e Ester; outros seis são poéticos: Jó, Salmos, Provérbios, Eclesiastes, Cântico dos Cânticos e Lamentações de Jeremias; e um, Daniel, é de evidente concepção profética e apocalíptica.
Os gêneros literários das obras que integram o grupo dos Escritos se acham misturados. O mesmo, em maior ou menor grau, ocorre também em outros livros da Bíblia. Recorde-se a esse respeito a forma poética de certas passagens dos Profetas (p. ex., Is 40—55, jóia da poesia do Antigo Oriente) ou do Pentateuco (Gn 49.2-27; Êx 15.2—18.21). Quanto às características da poesia hebraica, ver a Introdução aos Salmos.

Gêneros literários

Amalgamando temas e estilos, os ketubim dão um destacado lugar ao gênero sapiencial (do latim sapientia, ou seja, “sabedoria”), especialmente representado por Jó, Provérbios, Eclesiastes, por certos salmos e por algumas passagens de outros livros.
A sabedoria que esses escritos didáticos fazem permanente referência, tentando inculcá-la nos seus leitores, é de caráter eminentemente prático; não consiste tanto em um apelo teórico quanto numa exortação para saber viver, ou seja, para que o comportamento da pessoa seja adequado a todas e a cada uma das múltiplas circunstâncias da vida, que cada qual deve desempenhar de maneira correta no papel que lhe corresponde representar no meio da comunidade humana a que pertence. Assim como o bom artesão possui uma espécie de “sabedoria” que o capacita para esculpir madeira, forjar metal, engastar pedras preciosas ou compor belas telas (cf. Êx 35.31-35), também “o sábio”, segundo a perspectiva bíblica, possui a habilidade, a agudeza e as qualidades precisas para enfrentar com êxito as contingências da vida, quaisquer que sejam.
A sabedoria é, essencialmente, um dom de Deus desenvolvido prontamente pela experiência e pela reflexão. Porque a experiência do cotidiano é também, por sua vez, fonte inesgotável de sabedoria para aquele que anda com os olhos bem abertos e não se agrada da sua própria ignorância. Por isso, o sábio observa a realidade, julga aquilo que vê e, finalmente, comunica aos seus discípulos aquilo que ele mesmo aprendeu primeiro do seu relacionamento pessoal com o mundo circundante.
Para transmitirem o seu ensinamento, os sábios recorrem freqüentemente ao provérbio ou à reflexão que se acha nos Ketubim sob duas diferentes formas: a admoestação e a sentença. A primeira se reconhece logo pela freqüência do uso do modo verbal imperativo, empregado para aconselhar e exortar os discípulos acerca do caminho que devem seguir (cf. Pv 19.18; 20.13; Ec 7.21). A segunda, a sentença, consiste na breve descrição objetiva de uma realidade comprovável, de um fato sobre o qual não se pronuncia nenhuma espécie de juízo moral (cf. Jó 28.20; 37.24; Pv 10.12; 14.17; Ec 3.17; Ct 8.7).
Junto com essas fórmulas proverbiais, a Bíblia recolhe outros modelos didáticos utilizados pelos sábios para a transmissão dos seus conhecimentos: o poema sapiencial (Pv 1—9), o diálogo (Jó 3—31), a digressão no discurso (característica de Eclesiastes), a alegoria (Pv 5.5-19) e também a oração e o cântico de louvor (formas características dos Salmos).

Caráter e temas

Mediante a comunicação dos seus conhecimentos, da sua experiência e da sua fé em Deus, os sábios de Israel tencionam que os seus discípulos, a quem eles costumavam chamar de filhos (cf. Pv 1.8), aprendam a importância de desenvolver determinados aspectos práticos da vida. Entre esses aspectos, podem ser citados o autodomínio, especialmente no falar (Jó 15.5; Pv 12.18; 13.3), a dedicação ao trabalho (cf. Jó 1.10; Pv 12.24; 19.24; Ec 2.22) e o exercício da humildade, que não é debilidade de caráter, mas antítese da arrogância e do excesso de confiança em si mesmo (Jó 26.12; Pv 15.33; 22.4). Os sábios também valorizam altamente a amizade sincera (Jó 22.21; Pv 17.17; 18.24), ao passo que condenam a mentira e o falso testemunho (Jó 34.6; Pv 14.25; 19.5). Além disso, exortam a preservar a fidelidade conjugal (Pv 5.15-20), a tratar generosamente os necessitados (Jó 29.12; 31.16-23; Pv 17.5; 19.17; Ec 5.8) e a praticar a justiça (cf. Pv 10.2; 21.3,15,21).
Característico da literatura sapiencial é o tema da justiça retribuidora. Conforme esta, Deus recompensa o justo de conduta e castiga o mau (cf. Jó 34.11,33; Pv 11.31; 13.13), de quem são respectivamente figura o sábio e o néscio. De modo semelhante, os discípulos que seguem os conselhos de seu mestre serão premiados com o dom da vida, enquanto que a necessidade de outros (não ainda a intelectual, mas a de uma conduta ética vituperável) lhes acarretará a morte.
Importantes são também, sobretudo em  e Eclesiastes, os aportes dos sábios ao problema sempre atual do sofrimento humano (Jó 11; 22.23-30; 36.7-14; Pv 2; Ec 3.16-18; cf. Rm 11.33; 1Co 2.6-16) e da inevitabilidade da morte (Jó 17.16; 20.11; 33.19-22; 34.10-30; Pv 18.21; 24.11-12; Ec 8.8).

A sabedoria

Nos escritos sapienciais, não só se escuta a voz dos sábios de Israel, mas também, às vezes, se deseja ouvir a dos sábios de outros povos (Pv 30.1; 31.1). E, em certas ocasiões, inclusive a Sabedoria (personificada) fala e convida a todos a receberem o seu ensinamento, que é tesouro de valor incomparável (Pv 8.10-11). Como uma diligente dona de casa, a Sabedoria preparou um banquete do qual deseja que todos participem (cf. Pv 9.1-6). Em contraposição a ela, e também personificada, a Loucura tenta atrair com seduções e falsos encantos os ingênuos e os inexperientes (Pv 9.13-18).
Numa etapa posterior da sua história, o povo hebreu identificou a sabedoria com a Lei (lit. “instrução”) promulgada por Moisés no monte Sinai. Assim, Pv 1.7 estabelece que “o temor do Senhor é o princípio do saber” (cf. Sl 111.10; Pv 9.10) e Jó 28.28 afirma que “o temor do Senhor é a sabedoria, e o apartar-se do mal é o entendimento”, o que contém uma admoestação característica da lei mosaica e também de toda a Bíblia.


p. por exemplo
lit. literalmente

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